domingo, 5 de abril de 2009

Onde Mora a Verdade?

05 de Abril de 2010

Um sentimento muito especial foi tomando conta dele. Uma certeza infalível sobre o que era certo, o que devia ser feito. Enquanto ele observava seu oponente, esta clareza ficava cada vez mais forte. Como o outro não conseguia enxergar seu erro? Como era possível que o outro acreditasse tão fortemente em algo tão falho?

Naquele momento ele decidiu: se fosse necessário apelaria para a força. Isto era para o bem do outro. Ele não poderia permitir que o outro continuasse seguindo esse caminho que só poderia levar à desgraça. Era óbvio que o outro estava descontrolado, precisaria ser contido. Também era visível que o outro estava iludido, precisaria ser alertado. Ainda mais que isso, era muito claro que o outro vivia na ignorância da verdade, portanto precisaria ser doutrinado.

Por um breve momento ele sentiu a satisfação de não ser o outro, saboreou o prazer de saber a verdade, ficou radiante consigo mesmo. Porém, logo suprimiu esses sentimentos mesquinhos. Seu conhecimento não era para seu próprio regozijo, mas para a iluminação do outro. Não deveria sentir-se glorificado, deveria sim sentir compaixão pelo outro. Afinal, ele tivera mais sorte, enquanto o outro continuava nas trevas da ignorância ele havia sido tocado pelos ventos da sabedoria.

Um pensamento martelou seu cérebro, criando uma certa irritação: como o outro não percebia seu erro, mesmo ele tendo explicado tantas vezes o que era certo? Por que o outro se aferrava tanto em suas crenças falhas, ainda por cima tentando convencê-lo do contrário? Isto era muito desgastante. Era tão óbvio que ele estava certo e o outro errado , que não havia justificativa que pudesse explicar aquele comportamento bizarro.

Agora ele já falava mais forte, mais alto. Era preciso fazer com que seu argumento fosse melhor ouvido. Para sua completa exasperação o outro também alterou o tom de voz. Começou a gritar. Então, era assim, teria que haver uma certa violência, porque não havia outra reação plausível para aquele comportamento tão inadequado. ??? ?Ð??º?? Por sorte ele era mais alto, mais forte, mais velho, com mais recursos. E era evidente que isso tudo também eram mais sinais de que a verdade estava com ele.

Ainda bem que sendo forte, ele poderia conter fisicamente o outro, sendo mais alto, poderia sobrepujá-lo, olhá-lo de cima para baixo, sendo mais velho, usar toda sua experiência para corrigir o outro e seus recursos lhe permitiam uma liberdade de escolha e de uso do poder que o outro não tinha.

Que felicidade saber-se tão privilegiado, tão certo, tão perfeitamente ajustado, enquanto o outro era tão errado, tão patético, tão fora do juízo que  nem sequer queria aceitar sua supremacia tão óbvia. Por que algumas pessoas eram tão difíceis de serem convencidas da verdade, meu Deus? Como alguém poderia continuar insistindo tão petulantemente no erro?

A irritação continuava aumentando. Ele sentia o sangue ferver com a estupidez do outro. Quem sabe uns bons tabefes não ajudariam. Afinal, ninguém morreu por levar um pequeno corretivo, ao contrário. Ele mesmo tinha levado algumas sovas em casa para aprender lições importantes. As pessoas tinham que receber limites. E alguém tinha que dá-los.

A tarefa não era das mais agradáveis, contudo parecia que era ele que teria que cumpri-la. Um gancho de braço, uma mordaça feita com as mãos. Imobilizando-o, silenciando-o, ele afinal poderia falar com calma e quem sabe o outro tivesse então bom senso para ouvi-lo. Mas, que esperança perdida. O outro continuava esperneando, chutando, brigando, murmurando. O jeito era apelar para uma atitude ainda mais radical.

Jogar o outro no chão e imobilizá-lo completamente. Até para sua própria segurança. Agora sim. O outro, em função de sua teimosia em não aceitar a verdade já estava meio cansado. Finalmente, parecia a ponto de ceder. Afinal, a verdade sempre vence, graças a Deus. Silêncio, rendição. Ufa, pensava que não conseguiria nunca dobrá-lo. Que difícil que é vencer a ignorância.

Afinal o outro parecia ceder. Ouça bem rapaz, disse ele. O que foi dito é verdade. Não é possível viver de outro jeito. Suas ilusões não vão levá-lo muito longe e podem até ser perigosas.

Conte aí, qual é seu nome?, perguntou ele, já meio arquejante pela forte disputa. Sonhos, respondeu o outro. Muito bem, eu sou Realidade. Que bom que você aceitou o que eu queria dizer.  Claro, respondeu Sonhos,  você está certo, e um sorriso maroto se formou em seu rosto.

Fonte: www.work.com.br

Autor: Dulce Magalhães

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